terça-feira, 23 de julho de 2013

Retratos da “luta de classes” em Portugal



Alfa Pendular, sentido Porto-Lisboa, nove horas da manhã. Abandono o meu lugar numa das carruagens de 2ª classe e entro no bar. Do outro lado, proveniente das carruagens de 1ª classe e com um desfasamento temporal de meio segundo em relação a mim, um homem de estatura média coloca o primeiro pé no chão que já piso com os dois. Dirijo-me ao balcão, há um último croissant na vitrina. Quando me preparo para o pedir sou surpreendido por um rápido “um Compal de pêssego e um croissant por favor” gritado da outra ponta. Olho para o indivíduo com raiva. Usa fato de riscas e botões de punho prateados. É banqueiro ou industrial, penso eu, antes de reparar nos sapatos.  Estão todos borrados! Pelo cheiro não há dúvida, é bosta. O filho de uma saca de putas é latifundiário. “Ouça lá” – digo com cara de mau – “entrei primeiro na carruagem e queria aquele croissant”. “Se queria é porque já não quer” – responde-me o insolente com um sorrisinho de quem usufrui de mais-valias originárias da exploração do proletariado – “e eu pedi primeiro”. A empregada observa a cena com ar apreensivo. “É verdade” – diz ela – “este senhor pediu primeiro”. Desisto! É notório que a pobre moça agrilhoada pela CP se deixou intimidar pelo estatuto socio-económico do meu rival.  Ou então pelo cheiro das botas. Volto para o meu lugar, com fome e desanimado. Marx tinha razão. Pacheco Pereira ainda tem. Pego no iPad e encomendo todos os livros dos dois. Através de um site americano consigo encontrar t-shirts do Che Guevara a 20 dólares cada. Comprei cinco. É oficial, virei revolucionário.              

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