quarta-feira, 23 de abril de 2014

δημοκρατία


Sólon Júnior, Clístenes Júnior e Péricles Júnior comemorando o 2520º aniversário da Democracia Grega



Francisco Assis dedicou a sua crónica no Público à análise das capacidades intelectuais de Pedro Lomba, “um pequeno apparatchik ligeiramente alfabetizado” e de Bruno Maçães, “um robot tecnocrático que escreve tweets patetas num inglês próprio de quem nunca leu Shakespeare”.

Compreendo bem as críticas de Assis a estes dois secretários de Estado e tomo como minhas as suas considerações. Não é à toa que o deputado socialista, à semelhança dos restantes militantes do PS, alerta sistematicamente para a falta de qualidade das escolas estatais e para a necessidade de reformar e liberalizar o sistema de ensino do país. Pedro Lomba é licenciado, mestre e doutorando pela Faculdade de Direito de Lisboa, escola pública onde também foi professor assistente. Não é pois motivo de espanto que deixe muito a desejar em termos de alfabetização. Já quanto ao qualificativo de apparatchik, é evidente que um homem como Francisco Assis não pode pactuar com boys que não conhecem a vida exterior às paredes das concelhias partidárias. Recorde-se que entre a conclusão do seu curso de Filosofia e o início, aos 24 anos de idade, do seu mandato como Presidente da Câmara Municipal de Amarante, decorreram dezenas de semanas, talvez até centenas de dias, em que Francisco Assis laboriosamente construiu uma carreira profissional de sucesso longe dos meandros do aparelhismo. E todos os cargos posteriores que desempenhou, de Deputado à Assembleia da República pelo Distrito do Porto a Deputado à Assembleia da República pelo Distrito da Guarda, passando pelos mandatos de deputado ao Parlamento Europeu e de Vereador da Câmara Municipal do Porto, foram conquistados com base nos saberes que adquiriu nesse longo período de não submissão às dependências ideológico-partidárias. Com um curriculum destes é normal que tenha pouca paciência para os profissionais da política.  

Em relação a Bruno Maçães, que ainda por cima “foi a Atenas dar lições a um povo que já conhece a democracia há mais de 2000 anos”, compreendo ainda melhor a justiça das críticas. Em primeiro lugar não nos podemos esquecer do papel de Francisco Assis como líder parlamentar do Partido Socialista entre 2009 e 2011. Como poderia um homem habituado a conviver de perto com o poliglota José Sócrates não ficar horrorizado com o inglês que o secretário de Estado Maçães trouxe do seu doutoramento em Harvard? Anos e anos a ouvir discursos num inglês e num espanhol próprios de quem leu várias vezes todos os textos de Shakespeare e de Cervantes só poderiam ter como resultado esta tremenda sensibilidade à precisão linguística. Além disso, para um licenciado em Filosofia como é o deputado Assis, é de todo incompreensível que se dirijam quaisquer tipo de considerações ao povo helénico. Como é possível que Bruno Maçães se atreva a tal? Julgará ele que os gregos andaram a inventar a Democracia para se sujeitarem a ouvir coisas com as quais não concordam? Por este caminho chegará o dia em que, discursando no Reino Unido, alertará os compatriotas de Newton para a necessidade de se conformarem com as leis da gravidade!
Péricles, o grande estadista da Grécia Clássica, célebre pela sua serenidade e controlo das emoções, e verdadeiro símbolo do período áureo ateniense, descreveu em poucas palavras o carácter ético e democrático do seu regime: “um Estado administrado no interesse do povo e não no interesse de uma minoria”. Qualquer pessoa que não seja um robot tecnocrático percebe, pela simples visualização dos noticiários, que o povo grego sente que é assim governado, de modo contínuo e constante, há mais de 2000 anos. Aliás, bastaria a Bruno Maçães observar a serenidade que se vive na Praça Sintagma ou o controlo das emoções presente nos derbys entre o Olympiacos e o Panathinaikos, para perceber que vive um Péricles na cabeça de cada grego. E por vezes, quando o grego se encontra com a cabeça rachada a meio, podem até viver dois.   


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