terça-feira, 11 de outubro de 2016

Sermão de Santo António aos peixes de olhos em bico

Quem vai acompanhando os discursos de António Costa aos chineses já percebeu por certo que estes nunca coincidem com os discursos de António Costa aos portugueses. É como se um outro António, neste caso o Santo, tivesse separado os peixes em dois grupos e pregado um sermão diferente a cada um, dando assim origem a confusões e mal-entendidos que complicariam para sempre a vida de crentes e de teólogos.
Em Fevereiro de 2015, depois de ter passado anos a denunciar os erros do Governo e a trajectória descendente de Portugal, Costa agradeceu a uma plateia de investidores orientais o contributo que tinham dado na vitória do país sobre a crise de 2011. E agora, depois de ganhar avassaladoramente o 2º lugar das eleições legislativas com uma campanha em que se denunciava a venda de Portugal à China, viaja para lá em busca de mais compradores*. Confuso? Não, caro leitor, a palavra certa é Confúcio, o grande filósofo chinês. António Costa, quando está na presença dos concidadãos deste influente mentor da ética, honestidade e honradez, é atingido pela mesma maldição que desgraça a vida de Jim Carrey no filme Liar Liar: não consegue mentir! E como o confucionismo se dedica igualmente a fomentar o juízo e a prudência, o nosso primeiro-ministro fica também muito mais sensato quando se encontra no Império do Meio. Assim, depois de uns dias de namorico com o Bloco de Esquerda e com o PCP à luz da tributação do “grande capital”, bastou chegar a Pequim para afirmar convictamente ao PM Li Keqiang que as empresas não vão pagar mais impostos no próximo ano e que o seu Governo tem como objectivo a estabilidade fiscal. Desde o longínquo dia em que Deng Xiaoping se entregou nos braços do capitalismo que os marxistas lusitanos não recebiam uma notícia tão triste proveniente da República Popular.
Na verdade, penso que António Costa e, por arrasto, o país se encontram encurralados num anagrama: “Analecto” é um conjunto de escritos, sendo Os Analectos de Confúcio o mais conhecido exemplo para quem se deixa influenciar pela moral confucionista; “Anacleto”, por outro lado, é um nome, sendo Francisco Anacleto Louçã, um dos arquitectos da geringonça, o mais conhecido exemplo para quem se deixa influenciar pela treta moralista. Infelizmente, e dada a Geografia, enquanto os assessores e adjuntos de António Costa não começarem a ir trabalhar de robe comprido e olhos em bico, vamos continuar a ter um PM menos condicionado pela moral dos Analectos do que pelas tretas do Anacleto.
 
*eu também fui assim no Liceu: criticava a libertinagem da Rute, mas só por ela não ser libertina o suficiente para me dar uma hipótese.  

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